De volta à discussão a proposta de emenda constitucional do Voto Impresso no Brasil

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urna eletrônica. Foto: Nelson Jr./ ASICS/TSE

Políticos e representante da Justiça Eleitoral opinam sobre a proposição, que custaria aos cofres públicos R$ 2,5 bilhões

As eleições de antigamente já foram de forma oral e na base do voto de papel. Durante a campanha, a votação e na apuração era grande a quantidade de papel utilizada. Em Mateus Leme, por muito tempo valeu o voto em cédulas de papel, antes da inauguração da primeira urna eletrônica, no ano de 2000. Para o cargo de prefeito, marcava-se um X no quadrinho à frente do postulante e o eleitor escrevia o nome do candidato no espaço destinado ao de vereador.

Aos analfabetos não era dado o direito de votar. A apuração dos resultados demorava uma eternidade, contando voto a voto, cédula por cédula e, muitas vezes, tinha-se que traduzir os votos, decifrar a vontade do eleitor naqueles garranchos escrevinhados nos pedaços de papel. Custava às vezes muitos dias para se chegar ao resultado da disputa. Sofria o candidato, sofria o eleitor, sofriam os trabalhadores da contagem.

Os escrutinadores da Justiça Eleitoral eram acompanhados de perto pelos fiscais dos partidos, ou pelos próprios concorrentes aos cargos eleitorais. Mas, ainda assim, houve muita denúncia de que os resultados foram modificados nas mesas de apuração, na ponta da caneta, especialmente nas cédulas de votos em branco. Um X era muito fácil de ser colocado no quadrinho vazio pela caneta do apurador de má fé, ou seja, o partidário disfarçado e esperto.

Deputada propõe a “materialização” do voto

Agora vem novamente à tona o debate em torno do voto impresso, depois de 25 anos de existência da urna eletrônica, tido como moderna, ágil e segura contra possíveis fraudes. A Câmara dos Deputados está propondo por meio de uma comissão especial, instalada no último dia 13, analisar um projeto de lei que quer tornar o voto impresso obrigatório no país. De autoria da deputada Bia Kicis (PSL-DF), a PEC 135/19 não estabelece que o voto seja feito em cédulas de papel, mas propõe que uma cédula seja impressa após a votação eletrônica. Assim, o eleitor poderá conferir o voto antes que ele seja depositado, de forma automática e sem contato manual, numa urna trancada para auditoria. Portanto, a proposta não visa a eliminação da urna eletrônica por completo e segundo Kicis, essa “materialização do voto eletrônico” seria a “solução internacionalmente recomendada para que as votações eletrônicas possam ser auditadas de forma independente”.

Segundo estimativa do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) a implantação do voto impresso auditável demoraria para ser implantado em todo o país, pelo menos dez anos, e custaria aos cofres públicos cerca R$ 2,5 bilhões.

Inconstitucional e inadequado

O Jornal de Juatuba e Mateus Leme ouviu a opinião de alguns políticos e, também, do Chefe do Cartório Eleitoral de Mateus Leme, Robson Luiz Batista, acerca do tema. O responsável pelo Cartório Eleitoral, Robson Luiz Batista, disse que vê a medida como um retrocesso sem precedentes. Entende que é também inconstitucional e vê o agravante da impressora travar, o voto do eleitor ficar exposto e assim quebrar o sigilo garantido pela Constituição. “A margem de travamento é pequena, se a impressora for de altíssima qualidade. Porém, se tivermos 2 ou 3% dos votos devassados, seria muito ruim para a democracia e, volto a dizer, inconstitucional”, considerou.

Robson afirma que o STF já se manifestou sobre isso diversas vezes e que o sistema atual, da urna eletrônica, já permite muitas auditorias e verificações, que são totalmente suficientes para garantir a idoneidade dos votos. Ele explicou que no caso da auditoria de votação paralela, por exemplo, é utilizado o voto impresso, para conferir a votação em amostras de urnas que iriam para a seção e vão para a auditoria, no dia das eleições. As urnas são auditadas com voto impresso ou cédulas de papel há anos e em todas as eleições, por amostragem/sorteio nessa auditoria. “No cartório eleitoral de Mateus Leme diversas auditorias já são realizadas. O servidor da Justiça Eleitoral reitera que a transmissão dos votos para totalização é a parte mais segura do processo, porque basta conferir os boletins de urna que ficam nas seções, com os que chegam no TSE, para totalização. “Sempre fazemos essa conferência e nunca houve problemas. Ou seja, o voto impresso é inconstitucional, inadequado, desnecessário e um retrocesso devastador. Fruto de profunda ignorância dos mecanismos de segurança hoje já adotados”, opinou.

Ainda segundo Robson, antes do segundo turno de 2018, foram convocados membros da sociedade civil, como o comando da Polícia Militar, um representante da OAB, eleitores dos candidatos que estavam na disputa, representantes das igrejas católica e evangélica, para que pudessem ser realizadas as auditorias das urnas já preparadas para o segundo turno. “Os mesmos escolheram uma urna, foram retirados os lacres dela, iniciado o sistema de votação, impressa a zerézima, os participantes votaram em cédulas, os votos foram digitados na urna escolhida, e ao final foi verificado o idêntico resultado no boletim de urna”, revela.

O resultado, segundo o Chefe do Cartório, demonstrou a confiabilidade do sistema eletrônico de votação. “O sistema eletrônico de votação, bem como a urna eletrônica são exaustivamente auditados, inclusive com a participação da OAB, do MP e dos partidos em todas as etapas. Por esta razão, nunca houve questionamento de diversos partidos e candidatos derrotados, porque sabem da integridade do processo”, conclui.

Ex-Prefeito Júlio Fares é favorável

O ex-prefeito Júlio Fares, diz confiar na urna eletrônica. Mas admite que para se evitar acusações de que as eleições foram fraudadas, é favorável de que seja feito, pelo menos, uma amostragem com a impressão dos votos. Na opinião de Fares, a proposta do voto impresso daria mais credibilidade, tranquilidade e segurança para as eleições. “Acho válido ter além do voto eletrônico a cédula impressa para conferência posterior, caso necessário. Sou favorável, com certeza”, pontuou.

Segundo Ted “país deve se espelhar nos Estados Unidos”

Já o presidente do legislativo de Juatuba, vereador Kelissander Saliba (Ted), afirmou que o tema ainda deve ser amplamente debatido, tanto nas esferas federais quanto com a população. “Essa questão atrasaria muito a eleição, as pessoas gastariam muito tempo votando na urna eletrônica e em papel. Acredito que para o presidente do país, defender isso, ele tem muito mais informações do que a gente, ele tem ao lado a Polícia Federal, Inteligência e todos os órgãos que podem passar informações concretas”, pontua.

Ted ainda reafirma que países mais avançados que o Brasil, como os Estados Unidos, continuam realizando a votação impressa por questões de segurança. “O país deve se espelhar nas grandes potências, acredito na urna, mas acredito também que possam ser implementados os dois sistemas, para garantir mais segurança ao eleitor, mas as discussões devem ser técnicas e ser debatidas com a população”, conclui.

Vereadora Irene diz que “PEC é um retrocesso”

A vereadora de Mateus Leme, Irene Maria de Oliveira, pontua que a medida não traz nenhum ganho para o eleitor, nem para a justiça eleitora e nem para o eleitor. Além disso, a parlamentar observa que é preciso aproveitar a tecnologia para facilitar a vida das pessoas e não complicar. ”Eu entendo que não há sentido nenhum nessa posição do presidente da República. Não foi constatada até hoje nenhuma fraude, inclusive o Brasil é um pais que está sendo copiado no modelo de voto eletrônico, se for em papel será um retrocesso”, relata.

Ademais, a vereadora trouxe uma questão que quando da época do voto impresso, se via muito ocorrer, o conhecido e repudiado “voto de cabresto”. “A partir do momento que o voto for impresso, políticos mal intencionados, podem tentar enganar as pessoas mais simples, ou até mesmo esses mesmos políticos, infelizmente podem querer uma prova de que aquele eleitor tenha votado neles. Um absurdo e não vejo nenhum ganho. Temos que evoluir, hoje o mundo é eletrônico, não podemos voltar ao antigo coronelismo”, enfatiza.

Lúcio Madureira:  “Deslegitimar o sistema de votação atual vai tumultuar as eleições de 2022 ‘’

O vereador, Lúcio Madureira, afirmou que confia no sistema atual de votação no Brasil. “Infelizmente, há muitos anos o voto impresso foi motivo das maiores roubalheiras eleitorais. Na república velha por exemplo, tinha até recibo, o que deu origem ao voto de cabresto”, relembra. O parlamentar acredita que o voto impresso seja um retrocesso para o país, “além dele representar várias formas de se ludibriar o resultado uma eleição, uma delas é levar o voto anotado para urna e sair com a cédula em branco para entregar o cabo eleitoral”, opina

Marcos Leiturista: “Voto impresso dará mais legitimidade às eleições”

Segundo o vereador Marcos Leiturista, de Juatuba, a impressão dos votos vai trazer mais legitimidade e transparência às eleições. “Após o processo eleitoral é muito grande o número de candidatos derrotados que se queixam dos resultados. Com o voto impresso e auditável não restará dúvidas a respeito da lisura dos resultados. O voto impresso “trará mais segurança ao eleitor”.

Ex-vereador Alexandre Avelar diz que “deve haver consulta pública”

O ex-vereador de Juatuba, Alexandre Avelar entende que seria importante deixar os dois sistemas ativos. “Após assinar a presença, o eleitor deveria ser questionado em qual sistema ele gostaria de computar o voto”. De acordo com Avelar, com essa consulta pública, na hora do eleitor votar, daria para avaliar o sistema mais utilizado. Consequentemente ele poderia ser adotado na próxima eleição, implementado o impresso ou mantido o eletrônico.

Mestre Israel diz que “voto impresso quebra o sigilo eleitoral”

Segundo Mestre Israel, o voto secreto nada mais é do que segurança jurídica e pessoal para o eleitor, e não dá para entender como uma “Ex-procuradora Federal, deputada federal, conhecedora das leis, da constituição apresenta um projeto de lei em que o eleitor perde o sigilo, a segurança pessoal tendo o próprio nome e do candidato que votou impresso”. Como Policial Penal, sei que as milícias e os traficantes estão envolvidos na política e consequentemente se o eleitor não votar no candidato deles vai ser punido.

Ainda de acordo com Israel, as pessoas humildes da periferia, ficarão nas mãos dos computadores de votos. “A minha opinião é que é um retrocesso. A solução para a política em nosso País é concurso público temporário para os cargos eletivos. Depois passariam pelo sufrágio universal. Esta barreira eliminaria pessoas sem conhecimento de causa”, expõe.

Outros políticos, como ex-prefeitos, ex-vereadores e atuais parlamentares, também foram acionados pela reportagem para emitir opinião acerca do tema, mas não quiseram se manifestar.

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